Segundo o filósofo pré-socrático grego Heráclito de Éfeso (540-470 a.C), os paradoxos fazem parte intrínseca ao nosso pensamento, como consequência da existência em nós de uma capacidade espiritual que ultrapassa a lógica natural das coisas, levando-nos a conjecturar sempre sobre os dualismos e as complementaridades que envolvem as aparentes oposições. Assim, são comuns as inter-relações entre o bem e o mal, a vida e a morte, o acaso e a necessidade, a saúde e a doença, determinismo e liberdade, etc. Contudo, a presença universal de um Logos conciliador mantém o equilíbrio das oposições, sustentando assim a eternidade das transformações.

Corroborando, como nos mostram as pesquisas, o Universo é formado por explosões periódicas de energia e destruição que se renovam constantemente, o que nos leva a ter de considerar as relações do tempo com a eternidade, sendo aquele a condição intrínseca da própria sucessão dos acontecimentos, ou seja, se não fosse o tempo, a própria eternidade não seria possível.  Assim, podemos entender a eternidade como uma categoria criada pelo nosso espírito, a partir do fato de que ela é concebida pela observação de que o tempo não tem fim, à custa de se ver encerrado o processo da própria criação.

Como consequência, importa que modifiquemos o conceito de história, produto da cultura, concebida até agora como um fato aleatório e extrínseco ao fenômeno universal, mas temos de passar a entendê-la como uma sucessão de acontecimentos intrínsecos à realidade do Universo, uma essencialidade que transforma a sua aparente ocasionalidade numa dimensão que se torna agora transcendente.

Ora, o entendimento de que a história está inscrita nas estrelas nos leva a alterar completamente nossa maneira natural de considerar tudo o que nos acontece, nossa vida e nossa morte, não mais como fortuidades, mas como fatos inseridos numa continuidade que ultrapassa suas condições físicas, abrindo-nos, portanto suas perspectivas sagradas. É assim que a eternidade já é contemporânea aos acontecimentos de agora, constituindo uma comunhão de realidade e transcendência.

É dessa forma que o espiritual se torna para nós como o verdadeiro real, a translucidez da matéria que é apenas um momento de transformação em algo mais consistente, porque inserido no contexto eterno de sua transitoriedade. A partir de então, tudo adquire sentido eterno, porque o tempo, em si mesmo, é apenas um momento de sua ocorrência.

Portanto, contemplar o tempo em sua dimensão eterna representa um salto do acaso material para a sua precedência espiritual, compreendendo que tudo tem um só condicionamento, holístico e divino, o eterno sagrado como fundamento de toda a realidade. Dessa forma, como tudo o mais, o fenômeno da crença religiosa adquire uma realidade trans-histórica, uma realidade mística inserida numa perspectiva eterna de convivência acima das contingências físicas, limitadas pela temporalidade. Pois essa, inserida na eternidade, assume um caráter de revelação, como o veículo mais importante para a superação do paradoxo temporal que tanto nos aflige. Então, assumindo uma perspectiva transcendente, tornamo-nos capacitados a compreender que tempo e eternidade jogam um mesmo papel na sustentação da criação que é mutável, mas que se sustenta em sua eternidade.

  • Autor: acadêmico Antonio Celso Mendes
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