O fato de que ninguém quer morrer é uma forte indicação de que a vida nunca quer ser interrompida, sendo a morte apenas um evento relacionado com o término funcional de nossos corpos. Por sermos dotados de uma natureza transcendente, com características peculiares que vão além do tempo e espaço, obtidas através de nossa consciência e espiritualidade, a garantia de nossa imortalidade é inferida. O corpo torna-se rígido, os ossos secam, pois são feitos de matéria orgânica que sofre entropia, como tudo no Universo. Porém, nossa espiritualidade, sendo de origem divina, é incorruptível.

A tradição histórica sempre acreditou nessa realidade, como extensamente registrado nos livros sagrados do Velho e Novo Testamento. São Paulo, na Carta aos Romanos, expressa em 8-11: “E, se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vocês, aquele que ressuscitou a Cristo dentre os mortos também dará vida a seus corpos mortais, por meio do seu Espírito, que habita em vocês.” No Evangelho de São João (4-23), Jesus, em diálogo com a Samaritana, declarou da seguinte maneira: Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade.”

O Espírito é um exemplo típico de virtualidade, um processo de criatividade, racionalidade, sentimento e liberdade que domina nossa subjetividade, confirmando, in concretu, a vida de Deus em nós, e, portanto, nossa natureza sobrenatural. O Livro de Jó nos garante em 8.32: “Mas é o espírito dentro do homem que lhe dá entendimento, o sopro do Todo-poderoso.” Logo, esse sopro de vida é o selo de Deus em nossa existência que, portanto, se torna imortal.

O profeta Ezequiel (cp. 37) recebeu a mensagem do Senhor Deus, em frente aos ossos secos: “Eis que eu abrirei os vossos sepulcros, e vos farei sair de vossos sepulcros e porei meu sopro em vós para que vivais”. Logo, a morte de nossos corpos é apenas aparente, confirmando nossa transcendência filial no Deus vivo.

Por outro lado, face às aflições da vida, gurus orientais sempre desejaram o fenômeno da morte, considerando-o mais como um processo de libertação. Isso não é o que acontece no interior da filosofia ocidental, que enxerga a morte como uma perda pessoal, causando a todos grande frustração. No entanto, como vimos, a aceitação de nossa realidade espiritual é um bálsamo de grande conforto em nossas vidas, sendo, porém, acolhida apenas por quem aceita a realidade do mundo transcendental em sua realidade etérea.

Apenas através da fé o ser humano pode entender que a morte não é um fato essencial, mas representa a continuidade da nossa existência em outras dimensões espirituais, constituindo uma comunidade da almas perenes que continuamente estão prontas em nos proteger, como por exemplo as aparições da Virgem Maria, em centenas de locais privilegiados, nos fornecendo graças e milagres confirmados pela ciência.

O silêncio de Deus frente ao sofrimento humano mostra que Seu respeito pela autonomia da criação é infinito, agindo de uma forma virtual e indireta, de acordo com as disposições de Sua graça e os apelos de nossa fé, e não cabe a nós tentar entender tais magnitudes. A humildade aqui é essencial para nos tornar dóceis às mensagens que vêm do além, em um Universo de muitas dimensões.

Em conclusão, admitir que a morte é uma transformação virtual deve ser nossa atitude mais coerente com a realidade complexa que nos cerca, abrindo nossos corações contritos ao milagre de estarmos vivos para testemunhar tantas transformações, pois aqueles que estão disponíveis na fé sentem que suas vidas são nutridas pelo Espírito que as cria. Como Pascal afirma, acreditar não é uma desvantagem, mas um crédito promissor em nossas vidas fugazes.

  • Autor: acadêmico Antonio Celso Mendes
  • Foto: arquivo APL
  • Imagem: Tumisu por Pixabay