O ser humano, desde o seu nascimento, possui uma capacidade explícita de espiritualidade, expressa em sua volição, ira ou amor, frutos de sua autonomia espiritual, coisas que os demais animais demonstram de uma forma apenas instintiva, nos indicando uma diferença ontológica em sua natureza.

Aristóteles, despertado por Platão, foi o primeiro pensador a distinguir com clareza que tudo o que percebemos da realidade é composto por duas categorias distintas, a matéria e a forma, advindas da composição de nosso corpo e de nosso pensamento, que percebem coisas exteriores seja através de nossos cinco sentidos ou também através de nossa inteligência, esta movida por um princípio não material que a determina. Dessa forma, chegamos à conclusão que nossa capacidade de perceber coisas abstratas depende somente de nossa capacidade de pensar, como concluiu mais tarde o pensador francês René Descartes: cogito ergo sum (penso, logo existo).

Na continuidade, torna-se pertinente meditar um pouco sobre o que constitui essas nossas capacidades, algo que ultrapassa os condicionantes materiais de nosso corpo, como um sopro transcendente a nos inspirar, ultrapassando assim sua materialidade, esta que é mesmo pura vibração de átomos, dotados, porém, de atividades vitais. Ora, isso nos leva imediatamente a constatar a natureza específica de nosso corpo material, cuja estrutura é inteiramente virtual, pela constituição de pequenas partículas, etéreas em sua substância.

Dessa forma, a origem de nosso pensamento é inteiramente espiritual, constituindo uma consciência abstrata alheia a seus condicionantes físicos, uma alma que se constitui apenas como um eflúvio quântico, que não sendo constituída de partes, coloca-se acima de sua capacidade de destruição, a marca eterna de sua origem transcendente. Ora, isso nos vem provar que, desde o início, não somos seres deste mundo, cujas reações expressam uma condição divina em sua origem.

Consciência, reflexão, volição e inteligência são características que constituem nossa realidade humana, sem pertencerem ao mundo da matéria, formando aquilo que uma antiga intuição denominou ser nossa alma, a morada em nós de nossa espiritualidade. Não sendo constituída de partes, nossa alma por ser etérea, é também dotada de imortalidade, por não conter partes e ser capaz de apresentar muitas dimensões, simultaneamente.

Alma e Espírito parecem ser semelhantes, mas temos de assinalar diferenças. A alma é o laço de união de nosso corpo com o espírito, este dotado de total autonomia, nos capacitando a ser criativos, racionais, sentimentais e aspirantes de liberdade, coisas que nosso interior intui desde o nascer, se nossas condições corporais forem normais. Em acréscimo, por extensão, convém assinalar que esse Espírito está presente desde o momento de criação do Universo, um sopro divino que o faz brotar como fonte de energia, sem a qual nada teria sido criado, imprimindo igualmente um sentido cósmico a tudo o que existe (Gen 1:2).

Ora, essa caracterização espiritual do Universo é perfeitamente constatável, bastando assinalar que, sem a presença nele de um providencial Espírito Transcendente, o caos jamais poderia ter se transformado em cosmos, ou mundo organizado, telefinalista e antrópico. Isso se comprova também pelos milagres que a energia luminosa demonstra em suas manifestações tecnológicas, verdadeiros fatos inusitados que ultrapassam o espaço e o tempo. Em conclusão, chegou o momento de ultrapassarmos a materialidade de nossa realidade, alterando a forma de considerá-la, reconhecendo que o desprezo da cultura em relação a sua transcendência é apenas um produto nefasto do que ocorreu nos séculos passados, a euforia do espírito científico.

  • Autor: acadêmico Antonio Celso Mendes
  • Foto do autor: arquivo APL
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