Segundo PASCAL, o pensamento faz a grandeza do homem. Sem dúvida, é o maior galardão de nossa raça, o principal fator que permitiu à espécie humana ultrapassar os seus limites naturais, diferenciando-a de todas as demais espécies surgidas sobre a face da Terra. Assim, foi a racionalidade humana que permitiu ao ser humano criar as maravilhas científicas e tecnológicas, livrando-o dos determinismos naturais, das doenças e do sofrimento corporal, mas principalmente como criador da arte, da filosofia e da religião.

Não obstante, importa que tenhamos uma atitude crítica com relação a mesma, tendo em vista o seu domínio avassalador sobre nossa consciência, tornando-a fonte de antinomias e paradoxos intransponíveis, se não tivermos uma devida cautela sobre seus efeitos em relação a nossa própria compreensão do que seja a verdadeira realidade das coisas.

Dessa forma, o primeiro problema diz respeito à nossa lógica, que insiste em negar a consistência de nosso pensar, julgando-o apenas um acidente fortuito de nossa mente, quando ele, na verdade, apenas confirma o ser que se impõe. Assim, viver é somente testemunhar os seres que se manifestam, é identificar-se com o milagre do aparecer.

Em complemento, vejamos o que acontece com o conceito de verdade, pressuposto fundamental  em qualquer afirmação, atitude ou consistência das coisas,  e, não obstante, não conseguimos caracterizar o que ela seja, pela ambiguidade de seus sentidos e por ser um conceito de relação. Como ideia-limite, a verdade se aproxima da realidade de Deus, fundamento de tudo que aparece. Por isso os gregos a chamavam de aletheia, eclosão de coisas vivas.

O mesmo acontece com a dicotomia entre sujeito e objeto, pelo trabalho de nossa mente que luta por caracterizar a separação de nosso pensamento das coisas. Ora, esta cisão é fator alienante, um desequilíbrio mental que separa o ser humano de suas condições integradas com tudo o que aparece, tornando-o autônomo das coisas.  Assim, propugnar por uma integração epistemológica entre nós e as coisas representaria um passo importante na unidade necessária à integração de tudo: Tu és aquilo (tattwamasi, como diz a sabedoria oriental).

Outro paradoxo existente entre nosso pensamento e as coisas diz respeito a nossa dependência ao sentido do tempo, sempre dividido entre passado, presente e futuro, quando fica fácil verificar que só é real o instante presente, o milagre da sustentação momentânea de tudo o que existe (sic). Ora, trata-se aqui de modificar radicalmente nossas impressões na forma de orientar nossa vida, valorizando o milagre do momento, nossa consciência por estarmos presentes entre o mundo dos vivos.

Dessa forma, nossa experiência deveria estar voltada sempre para o agora, o momento mágico que nos permite estar conscientes de nossas existências, superando o tempo sucessão, pois há uma virtualidade sempre presente em tudo que acontece, cabendo-nos apenas agradecer a ocasião de nosso existir.

Ora, segundo CHARLES SANDERS PEIRCE, entre o sem sentido de tudo o que existe, fica sempre nosso espírito a nos convocar para a consistência da realidade triádica que nos domina, pois entre eu e as coisas há sempre um conceito que os interpreta, um signo abstrato que os relaciona. Em conclusão, o pensamento, que é alienado na aparência, na verdade é concreto em sua natureza.

  • Autor: Acadêmico Antonio Celso Mendes
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