Os acadêmicos de Direito mais adiantados e os advogados mais recentes ainda puderam conhecer pessoalmente a figura de Francisco Pontes de Miranda e se surpreender com a extensão universal de sua cultura, representada não só pela produção de mais de 300 livros, cuja abrangência não se contenta apenas com as áreas mais amplas do direito público e privado, como se estende mais além do conhecimento jurídico e pela filosofia, psicologia, antropologia, linguística, matemática, biologia, física, literatura e até a prática da poesia.

Uma produção que se impõe não só pelo seu conjunto, como também não cede espaço de qualidade diante de qualquer outro universo cultural individual.

Francisco Cavalcanti Pontes de Miranda foi filho prematuro, nascido em abril de 1892 no antigo engenho Frexeiras, de São Luiz do Quitunde, em Alagoas. São Francisco de Assis foi seu santo padroeiro.

Seu pai e seu avô eram matemáticos, mas também frequentavam as áreas do Direito, e foi certamente por isto que, ainda aos 16 anos, o pai lhe ofereceu uma passagem para ir estudar matemática e física na Universidade de Oxford. Sua tia interveio e acabou por incentivá-lo a estudar o Direito aqui mesmo no Brasil, o que o levou a frequentar a Faculdade de Direito de Recife, onde se formou bacharel em Direito com apenas 19 anos. Essa escolha entretanto não o levou a se afastar da matemática e da física, que seguiu cultivando e veio a se servir delas para fundamentar e desenvolver os princípios de sua própria obra jurídica.

Foi bacharel em Direito, advogado, delegado, juiz de Direito, desembargador do Tribunal de Acusação do Distrito Federal, escritor, embaixador do Brasil na Colômbia, parecerista e conferencista, e até poeta.

Consta, porém,  que a amizade de Pontes e Einstein correspondeu a um período anterior à radicação do físico nos  Estados Unidos, oportunidade em que, durante a troca de cartas em alemão que praticaram, Pontes logo surpreendeu Einstein pelo grau de conhecimento que um jurista brasileiro revelava sobre sua teoria da relatividade, manifestando, inclusive, através de questionamentos pessoais em torno da curvatura do espaço físico, impressão que o levou, então, a sugerir ao amigo que reduzisse sua opinião a um trabalho próprio e o apresentasse perante o próximo Congresso Internacional de Filosofia, a ser realizado em Viena, em 1924. (As notícias colhidas do Congresso, em fontes diferentes, ora informam que a cidade escolhida do Congresso era Viena, em 1925, ora era Nápoles, em 1924).

O certo, no entanto, é que o trabalho foi realmente oferecido, mas dele se teve notícia de não ter sido acolhido, senão devolvido, sob a alegação de que o Brasil não estava inscrito no Congresso, ou, (noutra versão – menos provável, foi a de que o Brasil não tinha então tradição de produção de trabalho científico).

Devolvido, portanto, consta que, ainda assim, por sugestão do próprio de Einstein, o trabalho voltou a ser apresentado ao Congresso, que, afinal, para sua surpresa, acabou por acolhê-lo e foi até transcrito, impresso e inserto nos anais do mesmo Congresso.

Um ano depois, entretanto, 1925, Einstein esteve no Brasil, numa excursão para proferir uma série de conferências na Argentina e no Uruguai, ocasião em que Pontes esteve presente e com ele na Escola Politécnica do Rio de Janeiro, onde, após assistir a terceira e última palestra e acompanhar os aplausos gerais, teria assumido a palavra e prestado a Einstein sua homenagem pessoal, voltando, porém, a suscitar o questionamento sobre a teoria da relatividade e, sobretudo em relação a sua extensão ao espaço jurídico, cujas palavras de conclusão a imprensa local reproduziu assim: “Data vênia, Herr Einstein, a Teoria da Relatividade não considerou as implicações metafisicas das hipóteses que aventa. Das ciências físicas até as ciências jurídicas a diferença, saiba, é de grau… na Teoria da Relatividade o conhecimento, a informação não é só a do mundo em si, an sich, de que ela trata. Há de ser também das consequências, e seu desdobramento num mundo para todos nós, für uns.

Quando acabou o discurso, o comentarista seguiu então dizendo que o físico se pôs de pé, como fosse se despedir e entregou um papel a Pontes onde se lia: “Die Frage, die meinen Kopf entsprang, hat Brasilien sonniger Himmel beanwortel” (“A questão que minha mente formulou já foi respondida pelo radiante céu do Brasil”).

Era, certamente, a resposta de Einstein da confirmação da previsão da sua teoria da relatividade, observada na deflexão da luz pelo campo gravitacional do sol, durante o eclipse do sol, ocorrido em Sobral em 1919, cidade do Ceará, no nordeste brasileiro.

O resto, então, foi festa e confraternização!…

  • Autor: acadêmico Rui Cavallin Pinto
  • Foto do autor: arquivo APL
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