Leo de Almeida Neves faleceu dia 2 de novembro último, aos 88 anos, depois de cumprir uma longa carreira política e deixar uma presença exemplar na administração pública e privada do país.

A propósito recebi de sua viúva, a esposa Giselli, um belo exemplar do seu “Entreolhares”, um pequeno relicário que reúne homenagens e lembranças das que deixou de uma bela e leal vida política, do conforto da família e do convívio de amigos, onde se fez constar também a especial reparação de que, embora tenha enfrentado a voragem da revolução de 1964, que ceifou tantas vidas e excluiu do país outros tantos dos seus filhos, e dela resultou, também, a injusta cassação do seu mandato de deputado federal e a suspensão dos seus direitos políticos (ainda aos 36 anos de idade), pelo simples pretexto de participar de uma insólita Suprema Irmandade, para que depois e só mais recentemente, passado anos, a presidência da Comissão Especial de Investigação (CEI) viesse passar a seu favor, o atestado oficial de que, pelo contrário, em todas as suas atividades políticas-administrativas ou quaisquer outras manifestações político-ideológicas o investigado, Leo de Almeida Neves, não cometeu qualquer ato atentatório ao Regime ou às instituições democráticas e à segurança nacional, procurando assim, embora de forma tardia, reparar uma incurável injustiça.

Conheci Leo acadêmico de Direito, da UFPR, mais novo que eu na idade e na instituição, porém, já assumia postura política da então linha trabalhista de Alberto Pasqualini. O Brasil vivia na ocasião uma quadra de intensa vida política, com a deposição de Vargas e a instalação da primeira democracia brasileira.

Leo começou cedo integrando a organização da juventude trabalhista e, em 1958, se viu eleito deputado estadual para, em 1966, cumprindo um belo desempenho político-parlamentar, se converter no deputado federal mais votado do Estado, chegando a disputar sua concorrência ao próprio governo do Estado, que só não se consumou por intervenção direta do governo militar.

Assim, a participação política de Leo de Almeida Neves, na vida pública do Estado chegou a um tal grau de presença que consta que o governador Roberto Requião teria até sugerido que fosse entronizado seu retrato na galeria dos governadores do Estado, para reparar a injustiça de sua cassação pelo AI-5.

Tudo isso vai relatado no sacrário oferecido agora pelos seus e seus amigos, como lembranças do pai amoroso e prestante que, mesmo à meia noite, vindo do trabalho e dos compromissos do dia, preparava a mamadeira da filha ou apreendia violão e cantava com a de 13 anos as canções da resistência. Foi pai que conferia os boletins da escola do filho e passava ao adolescente Fernando a lição singela dos “excluídos”, com a recomendação de que devia evitar de comprar produto dos Estados Unidos, porque lá se praticava o capitalismo selvagem. O nome de Abilon foi homenagem a seu líder e gestor político e hoje ele é gerente executivo de plataformas digitais da maior empresa de consultoria de tecnologia do mundo. Da Lea se disse pouco mais, além do amor de filha.

Enfim, Leo cumpriu um destino realmente muito bonito. Pôs sua juventude a serviço do país ainda adolescente, e tentou fazer do ideal nacional-socialista sua bandeira política, colhendo os primeiros aplausos, infelizmente logo contido por ato de força da reação, que o suprimiu ainda  jovem da vida política e tolheu seu direito de opinião.

Poderia ter reagido ou se recolhido à obscuridade, como seria melhor ou fizeram os outros?

Não!  Pois, mais próprio do seu temperamento e da fidelidade a seus ideais, passou a receber em troca, e desde logo, o apoio e o acolhimento de inúmeros amigos e figuras representativas da vida empresarial do país, com a oferta de uma série de cargos e empregos relevantes no próprio serviço público e no privado do país, que o animaram, enfim, pela promessa de  continuar servindo aquele mesmo ideal público que, até então, animara sua vida e, além disso, representava, de algum modo, uma maneira justa e compensadora de prosseguir na sua devoção social, como também a voltar a oferecer sua inteligência e seu trabalho em benefício do seu país.

E, assim se alinharam os cargos e empresas que passou a servir: diretor da carteira agrícola e industrial do Banco do Brasil; presidente do Banestado; delegado do IPÊ, diretor do Instituto Brasileiro do Café; presidente do Conselho de Administração da Copel; presidente da Cacique de café solúvel e presidente da Cacique de armazéns gerais.

E nesse rol ainda se incluem o convite que recebeu de Fernando Gasparian para trabalhar na América Fabril, a maior indústria têxtil do Brasil, na Metal Gráfica, de Edwar Merhy, em Ponta Grossa, além de outros empresários de Curitiba e Londrina.

Enfim, posto isso, só nos resta observar que, na verdade, todo este cenário de vida e seu destino, personagens e eventos, oferecem um background com visão ampla do quadro político brasileiro de então. Mostra a intimidade de uma união conjugal que só se desfez com a morte de um deles. São seis filhos, com formação bem orientada e destinos claramente definidos. E, principalmente, refaz a imagem da formação e presença de uma vocação de líder, que o ardil da política infelizmente interrompeu,  mas que se refez por seus méritos, conservando o mesmo ideal de grandeza e benefício social.

Um quadro amplo, portanto, aberto à luz direta da vida, em que cada um cumpriu seu papel distinto, sem disfarces ou prevenção de entreolhares.

Li todo o livro e pude rever de frente todas as minhas lembranças.

  • Autor: acadêmico Rui Cavallin Pinto
  • Foto: arquivo APL
  • Imagem: cedida pelo autor