Seguindo a ordem histórica, Francisco Itaciano Teixeira foi o segundo procurador-geral de Justiça do Paraná. Chefe do Ministério Público estadual de 1892 até janeiro de 95, após o que foi nomeado ministro do então Superior Tribunal de Justiça.
A propósito, registra Octávio Secundino Júnior (“O Solar do Barão”, p. 173) que nos primeiros meses de 1894, durante a Revolução Federalista, quando Gumercindo Saraiva e seu exército rebelde batia em retirada pelo rio Iguaçu, no caminho de Lages, com destino ao Uruguai, o juiz Itaciano Teixeira, de Ponta Grossa, saiu ao encontro do general Ewandro Quadro, em Castro, que descia de Itararé com duas divisões, para anunciar que os rebeldes já estavam deixando o Estado. A notícia alvissareira foi então compartilhada com toda tropa, tanto como serviu para que Itaciano fosse contemplado depois com sua promoção para uma das vagas do Tribunal, embora isso custasse o prejuízo de muitos dos seus colegas, com mais direito que ele.
No entanto, o novo ministro veio a falecer um ano depois, de doença hepática, com apenas 36 anos de idade.
Embora tenha cumprido tão curto tempo de judicatura, Itaciano mostrou competência e dedicação à carreira, deixando obra escrita, como seu “Plano de Reorganização da Justiça do Estado do Paraná”.
Pelos recenseamentos nacionais, o Paraná tinha a essa época, próximo da República, perto de 250 mil habitantes, 14 comarcas, 20 termos e 5 vagas de ministro no Superior Tribunal de Justiça,
Entretanto, não deixou nenhum retrato para compor a moldura da galeria histórica dos membros do Tribunal de Justiça. A moldura que lhe corresponde ainda está lá e permanece em branco.
Porém, como membro da equipe do Memorial do Ministério Público, ficamos de recompor sua imagem e o registro de sua passagem pelos albores do Ministério Público, recorrendo a toda sorte de dados, documentos e testemunhos a nosso alcance.
A certo tempo, porém, soubemos da existência de um neto seu, residente na cidade de São Paulo, que conservava em sua residência um rico acervo de sua memória pessoal. A notícia correu por conta de sua vizinha, que se dispôs a colaborar conosco na pesquisa, intermediando nosso contato. Durou pouco, porém, a mediação. Logo o neto se fechou em copas, alegando que tinha tudo sobre seu avô, mas não estava disposto a revelar nada a ninguém, porque o que queriam era ganhar dinheiro à sua custa. Com isso a vizinha se desculpou e assim se desfez do encargo.
E, foi então que resolvi aceitar o desafio, aproveitando uma viagem a São Paulo. Fui ao endereço indicado, na rua dos Macunis, da vila Madalena, levado por um amigo. Ai, a imagem que tive foi a de uma casa antiga e mal conservada. Tinha um jardim à frente, mas sem maiores cuidados. Postei-me, então, à frente e bati palmas, anunciando meu intento. Vinha em visita ao morador Dâmaso Bittencourt, neto do desembargador Itaciano Teixeira, trazendo homenagens do Tribunal de Justiça do Paraná. Insisti na saudação e me vi atendido por um homem idoso, à porta da casa, que me veio ao encontro. Anunciei o que me havia trazido: uma entrevista com o neto, animado pelo propósito de recuperar a memória do avô para a justiça paranaense.
Fui então recolhido à varanda da casa, mas passei a ouvir uma longa digressão, dele sobre ele mesmo, falando de sua vida e das qualidades pessoais que ainda conservava de velho advogado e poliglota, versado até na língua hebraica. Ao insistir, porém, na memória do avô ele se pôs a sério e comovido, para exclamar incisivo: queimou tudo, doutor! E logo explicou: tinha tudo num compartimento isolado da casa, mas em data recente lavrou fogo no compartimento e destruiu tudo. Foi uma calamidade, uma desgraça! Mas, diante do meu desencanto, procurou me consolar. Disse, ainda tenho tudo na memória, doutor. É como fosse ontem… Tenho seu retrato inteiro, embora seja uma lembrança de menino. Vou fazer seu retrato e vai ser como uma fotografia. O senhor vai gostar.
Vou mandar para o seu endereço; o senhor vai ver… Assim agradeci a acolhida e dei a entrevista por terminada. De volta, passei a notícia da viagem aos colegas de trabalho e mencionei o tal desenho com préstimo de “fotografia”. Falei, porém, com descaso, dada a falta de confiança na habilidade artística do velho e a distância que o mantinha de suas lembranças. Baldo engano. Dias depois o retrato prometido chegou, um desenho a crayon, bisonho, representando a imagem de um garoto ou um adolescente vestido de adulto, incompatível com a figura habitualmente austera de um magistrado de nível superior, ou de um procurador-geral, por mais jovem que pudesse ser.
Enfim era um “retrato”, embora não lhe conferisse qualquer autoridade ou autenticidade. Na verdade, assim se fez da história ciência. Feios ou bonitos nossos heróis têm a imagem histórica como resultado de circunstâncias ou da criação do artista. Tantas vezes nem supomos como foram. Que aparência tinham Platão e Aristóteles, ou o nosso Tiradentes? Na verdade, o próprio Cristo, de milenar memória, tem imagem contestada. Posto isto, eis aqui o homem, com o único retrato que pude colher.