O processo de ocupação e urbanização do norte do Paraná, pela Companhia de Terras Norte do Paraná (1924-1944) está entre os primeiros e mais bem sucedidos projetos de povoamento e desenvolvimento de nosso país, sob o impulso da marcha pioneira do café. Certamente o café está à frente de tudo, aproveitando a vantagem proporcionada pelo Convênio de Taubaté e da oportunidade de se servir do contingente imigratório de japoneses e europeus que demandavam a nosso Estado.
Desse primeiro momento há um cenário bem representativo da presença inglesa da Missão Montagu no Brasil, junto ao presidente Artur Bernardes, constituída pelo Lorde Edvin Montagu, líder do grupo, por Charles Adds, diretor do Banco da Inglaterra, Charles Withers , ex-redator do “Economist” e Lorde Lovat, diretor da Sudan Coton Syndicate e assessor inglês para assuntos de agricultura e florestamento. Vinham, na verdade, a serviço da cobrança de dívida do Brasil, no esforço de promover a recuperação de graves problemas financeiros do seu país, herança da participação da Inglaterra na primeira guerra mundial, gerando o acúmulo de uma dívida de 100 milhões de libras nos bancos ingleses, além de uma inflação de 30%, e uma faixa de desemprego que alcançava 3 milhões de desempregados, sobretudo da indústria naval e do aço.
Lorde Lovat viera a serviço da Missão, mas trazia também interesse pessoal de promover investimentos produtivos no país, sobretudo no setor do algodão, visando suprir a indústria têxtil inglesa, diante do declínio das lavouras de algodão do Sudão.
Foi assim que, após algumas tentativas frustras com investimentos na cultura do algodão no Paraná e em São Paulo, Lovat conheceu a fazenda do Bugre, em Cambará, propriedade de 5 mil alqueires com 5 milhões de cafeeiros, do major Barbosa Ferraz, ocasião em que, debalde, propôs comprar a fazenda por preço milionário daquele tempo. Diante da recusa, Lovat foi então aconselhado a investir em terras devolutas do Estado, que o governo estava oferecendo na região, para projetos de colonização. Seu projeto levado à Inglaterra, fez surgir, em 1924, a empresa Brazil Plantations Syndicate Ltd., depois convertida em Paraná Plantation e, como subsidiária, a Companhia de Terras Norte do Paraná.
Deposto o governo imperial e implantada a República, o estado do Paraná passou a dispor de suas terras devolutas (Const. 1891, art. 64). Aproveitando a expansão pioneira das lavouras paulistas de café, a presença do contingente migratório estrangeiro e a falta de recursos para promover a ocupação e o desenvolvimento da maior parte do território paranaense, o presidente Caetano Munhoz da Rocha promulgou em 5 de abril de 1916 a Lei n.º 1.642, de feição liberal, que convocava a iniciativa privada para a obra da colonização do Estado mediante concessões de áreas de até 50 mil hectares ou mais, para divisão em pequenos lotes.
Ocorre, porém que, com o tempo, o projeto sofreu “inomináveis abusos” e a “formação de latifúndios” razões pelas quais, ao fim da revolução de 30, o interventor Mario Tourinho revogou todas as concessões, com exceção, porém, dos contratos celebrados com a Companhia de Terras e Francisco Gutierrez Beltrão, a partir de quando o governo assumiu diretamente a responsabilidade dos empreendimentos imobiliários e, nesse sentindo, passou até a criar várias colônias no Norte: Jaguapitã, Içara, Paranavaí, Centenário, Interventor e, outras no Oeste, Piquiri, Cantu, Goio-Erê, Mourão, etc., concorrendo com as colonizadoras privadas.
A esse tempo, no entanto, a cafeicultura paranaense passou a sofrer um surto maior de interesse e demanda, o que levou inúmeras outras empresas particulares a se envolverem nos empreendimentos imobiliários.
Porém, ao contrário da opinião comum, o desenvolvimento do norte do Paraná não resultou apenas da presença e do desempenho da CTNP. Sem dúvida ela representou um projeto inédito de colonização no país, bem dirigido e bem cumprido, associado a outros 41 empreendimentos imobiliários iguais em nosso país.
Mas, tem outro particular, abrangendo todo o projeto colonizador, sustentado pelo arquiteto e urbanista, mestre e doutor pela FAU-USP Alessandro Filla Rosanelli, professor da UFPR, de que a colonização do norte do Paraná não foi só um projeto agrícola pioneiro, foi também um projeto urbanístico. Citando tantas vezes Pierre Monbeig, geógrafo francês, nosso Rosanelli chama atenção para o pouco interesse mostrado pelos que tratam do avanço de nossas fronteiras sobre o papel cumprido pelas cidades, limitando-se à transformação da paisagem rural, ao progresso do povoamento ou a sua estrutura econômica ou fundiária.
A bem de ver, a versão que hoje se tem da conquista da fronteira é resultado da ação desses dois elementos distintos e inseparáveis, que são a colonização rural e a fundação de núcleos urbanos. Quando a fronteira ganha face urbana aí então ela se converte em espaço urbano.
Ora, as loteadoras semearam cidades por todo o norte do Estado, variando o número de acordo com os períodos de maior atividade. Até 2000, ou quase isso, foram fundados no norte do Paraná 96 núcleos urbanos, dos quais 62 pela CTNP, formando uma rede urbana e de boa densidade.
Esses primeiros núcleos surgiram, tantas vezes, de estabelecimentos comerciais de beira de estrada, ou nascidos da doação de um fazendeiro, senão de doação governamental ou são parte de um plano de colonização. Nascem às vezes ao redor de um hotel, de um cruzamento de trens. A ferrovia e a estrada de rodagem também têm servido como “agentes de povoamento”. As cidades têm em regra 30 km uma da outra, distância comum para que as ferrovias se sirvam do abastecimento de lenha ou de água.
O planejamento das estruturas agrárias procura evitar o isolamento do sitiante, porque a proximidade de uma cidade é sempre condição favorável para atrair para a compra do sítio.
Enfim, o tema da colonização do norte do Paraná, ainda mantém espaço aberto para que, diante da admiração e do orgulho de nossa prosperidade e da integração do Paraná de hoje, mesmo assim desperte nosso interesse em reviver os traços originais de sua complementaridade.