O falecimento de Léo de Almeida Neves representa o fim de fato do velho Partido Trabalhista Brasileiro, fundado por Getúlio Vargas antes das eleições de 1950. De direito o partido continua funcionando, depois de ser sido refundado pela Deputada Ivete Vargas, sobrinha de Getúlio, durante o processo de redemocratização do país, na década de 1980. Porém, o PTB histórico não voltou a existir, tendo se tornado moeda de troca ao longo dos anos.
Léo sabia disso, tanto que não voltou ao seu partido de origem. Filiou-se ao MDB – depois PMDB – e lá ficou até o fim. Voltou à política, assumiu como por breve tempo a cadeira de deputado federal que lhe havia sido usurpada por uma espúria cassação na esteira do AI-5 e foi senador suplente de Roberto Requião, também assumindo o cargo por curto período.
Sua candidatura à Academia Paranaense de Letras deve-se a Belmiro Valverde Jobim Castor. Lembro bem da ocasião. Éramos cinco acadêmicos, reunidos no apartamento do próprio Belmiro, no Cabral: além do anfitrião, Albino Freire, Carlos Antunes dos Santos, Valério Hoerner Júnior e eu. Buscávamos um candidato de peso para substituir Wilson Bóia na Cadeira n. º 26. Entre tira-gostos e uma taça de vinho, Belmiro propôs:
– Vou dizer um nome que sempre esteve em posições contrárias às minhas no espectro político. Mas convivo com ele no Conselho Superior da Associação Comercial do Paraná e o admiro pela honestidade intelectual, expressa nos livros que escreveu, e por suas posições ponderadas, de homem com verdadeiro espírito público: Léo de Almeida Neves.
De pronto, todos aceitaram a sugestão. Fui encarregado de sondar o presidente Túlio Vargas sobre a candidatura. Túlio entusiasmou-se: seria o quinto acadêmico oriundo da sua turma da Faculdade de Direito da UFPR. Os outros eram Erilberto Trevisan, Leopoldo Scherner e Luiz Geraldo Mazza. Restava convencer o próprio Léo, que encarou a candidatura com muita simpatia.
Sua eleição se deu por ampla margem, sem sustos. Algum tempo depois, tomou posse em sessão solene da Assembleia Legislativa do Paraná, recepcionado por Belmiro Castor. O discurso de saudação foi histórico, com Belmiro lendo a ficha de Neves, Léo de Almeida, no Departamento de Ordem Política e Social, o temido Dops.
Naquele mesmo ano de 2006 estava prevista a publicação de nova edição da Biobibliografia da APL, tarefa da qual eu estava incumbido. O prazo estava por vencer, mas Léo ainda não tinha tomado posse na Cadeira 26, nem havia encomendado a pelerine. Inventamos um estratagema: Léo foi ao estúdio da fotógrafa Tânia Buchmann, vestiu a minha pelerine e com ela passou a integrar o livro da nossa Academia.
Foi um político de rara estirpe. Tendo perdido o mandato depois de ter sido o deputado da oposição mais votado no Paraná, pré-candidato a governador em 1970, não ficou a chorar as mágoas. Arrumou sua mala e foi para o Rio de Janeiro espairecer. Reconstruiu sua vida profissional como diretor da Cacique Café Solúvel, sediado em São Paulo, onde morreu vítima de complicações da covid-19, ele que já estava doente há tempos.
Há dois anos as 27 bibliotecas do Sesc no estado receberam exemplares do livro “Privatizações de FHC, A Era Vargas Continua”, de autoria de Léo de Almeida Neves. Escreveu sobre este tema e outros porque foi testemunha dos grandes fatos políticos que ocorreram no Paraná e no Brasil nos últimos 70 anos.
Nascido em 1932, em Ponta Grossa, foi bacharel em Ciências Econômicas e advogado formado pela UFPR na turma de 1954. Deputado estadual pelo PTB a partir de 1958, em 1966 foi o deputado federal mais votado do Paraná. Sua ascensão política foi interrompida pela cassação do mandato, que lhe foi devolvido apenas 44 anos mais tarde, simbolicamente, pela Câmara dos Deputados.
Nesse meio tempo, exerceu inúmeros cargos, na área pública e na iniciativa privada. Procurador federal aposentado, foi diretor do Banco do Brasil, presidente do Banestado, diretor do Instituto Brasileiro do Café e delegado regional no Paraná do INSS. Além disso, fez parte de diversas entidades de classe, como Fiep e ACP. Até seu falecimento, prestou assessoria jurídica e tributária à Companhia Cacique de Café Solúvel, da qual passou a ser funcionário em 1970.
A vida de Léo de Almeida Neves mostrou coerência política, correção administrativa e rigor intelectual. Jornalista na juventude, aproveitou sua intimidade com as letras para escrever diversas obras como “Destino do Brasil: Potência mundial – A Era Vargas Continua” e “Vivência de Fatos Históricos”, em que relata a tomada do poder pelos militares em 1964. Em todas, salta aos olhos sua preocupação permanente com o cidadão brasileiro e o futuro do país.