Não há nada de mais natural, para nós, seres humanos, do que a constatação de que o tempo seja algo de muito real em nossas vidas, pela contínua transformação de tudo que ocorre ao nosso redor. Isso não obstante, atualmente, o astrofísico italiano Carlo Rovelli, pensador extremamente inovador no campo das últimas pesquisas sobre o Universo, tem declarado que o tempo não existe, na forma com que os seres humanos o percebem, tendo em vista a variedade com que este mesmo Universo se manifesta, bastando considerar o fenômeno das distâncias e a oclusão repentina dos fenômenos cósmicos.

A propósito, é oportuno conhecer a diferença conceitual realizada pelo pensador francês Henri Bergson (1859/1941), ao fazer a distinção entre tempo sucessão e tempo duração, o primeiro relacionado às nossas observações exteriores; já o segundo se refere à percepção de nosso mundo interior, que capta uma realidade instantânea, o milagre do surgimento repentino de todas as coisas.

Ora, essa discrepância existente entre o tempo para nós e para o Universo nos conduz a ter de elucidar como isso acontece. Dessa forma, já houve filósofos que negaram a existência do movimento, mesmo no mundo exterior, e, por consequência, a existência do tempo. É nossa própria racionalidade que nos permite pensar a negação da existência do movimento, como fez a escola eleatica de Parmênides e Zenon, este último com os seus paradoxos sobre a imobilidade consistente das coisas. Pelo primeiro paradoxo, Aquiles, um exímio corredor, concede à tartaruga, por sua lentidão, que saia na frente dele numa suposta corrida. O que ocorre então? Ora, pela divisão infinita dos momentos, o corredor jamais alcançaria sua competidora (sic!). Dessa forma, tal ocorre provando a ilusão sensível da existência do movimento.

Assim, a consideração de tudo o que ocorre como sendo apenas eventos repentinos, deveria nos conduzir a modificar a maneira como temos considerado a ocorrência dos acontecimentos que agora surgem, não mais como previsões a partir de nossa memória, mas sim fugindo das expectativas de tudo quanto possamos aguardar. Essa seria uma maneira nova de considerar a ocorrência de tudo que acontece, pois essa é uma expectativa comum em todo o Universo. Viver na tranquilidade dos eventos que não dependem de nós, eis um princípio saudável de conduta, como queria o filósofo Epicuro.

Na continuidade, não podemos deixar de considerar que tudo isso é resultado do labor de um Espírito que em nós é a causa principal que nos capacita perceber o milagre do surgimento da criação instantânea e repentina de tudo o que surge. Não obstante, porque Ele transcende as barreiras de nossa subjetividade, abrange todo o Universo, mantendo a sua transformação, sem se perder no caos. Há, pois, um instante eterno na aparente sucessão dos fenômenos cósmicos, o que deveria revelar uma atitude de humildade diante de tantas surpresas.

Em conclusão, é o tempo aparente que permite a renovação constante de todos os acontecimentos, submetendo o mundo material à lei da entropia ou o desgaste natural que afeta todos os fenômenos. Contudo, nossa intuição nos revela que sem um Espírito Eterno que regule a sustentação de tudo no Universo, nada teria saído do caos. A propósito, o poeta português Fernando Pessoa sentiu-se inspirado pelo colapso do tempo: “Sinto-me nascido a cada momento, para a eterna novidade do mundo”. Dessa forma, saibamos reconhecer em nós a presença de criatividade, racionalidade, sentimento e liberdade como poderes transcendentes concedidos à nossa animalidade, sem os quais nós seríamos como os que apenas vegetam.

  • Autor: acadêmico Antonio Celso Mendes
  • Foto do autor: arquivo APL
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