Na época em que se estudavam as classes gramaticais (eram assim ditas em um tom quase bíblico), coisa de substantivos adjetivos verbos preposições e quejandos, as interjeições ficavam sempre no final da fila.

Nos textos que líamos, com voz empostada e lentidão para evitar as armadilhas da pontuação, pois geralmente o fazíamos para que o professor avaliasse o grau de desenvolvimento da leitura – ai de nós! – interjeições eram praticamente inexistentes.

Ufa! Afinal textos sisudos se apoiam mais nas palavras substantivas (principalmente as abstratas, como amor, vingança, honra, patriotismo, amizade) e nos verbos, em especial no indicativo ou no imperativo afirmativo (hei, ainda se usa isso?), como obedeça, respeite, cumpra, faça.

Puxa vida, não é que me vieram à memória textos do livro de leitura – nem sempre usado em sala, porque ficava na conta dos “deveres de casa” – escritos por autores célebres na época: Humberto de Campos, Manoel Bonfim, Thales de Andrade, Olavo Bilac, Júlia Lopes de Almeida, Artur Azevedo, Rui Barbosa e assemelhados? Uma plêiade de escritores nem sempre contemporâneos, mas clássicos da literatura escolar.

Nossa, como o tempo muda autores, preferências, estilos e expectativas de leitura!

Viva a vida com suas transformações!

Francamente! Não sei se me prefiro hoje, alquebrada e desiludida, à lépida criança que cantava a lista de preposições e advérbios e que recheava suas redações de pontos de exclamação e pontos finais.

Cruzes! Hoje crescem em mim as interrogações em quantidade e tamanho; este, porque os olhos mal dão conta da fonte 14. Os pontos finais tornaram-se reticências: as certezas são pantanosas e o universo já extrapolou o grão de areia que representei um dia (ou como dizem levianamente os jornalistas redundantes: representei na minha “era”).

Alto com este texto digressivo! Volto às interjeições. Encontrei no dicionário (ah, ele continua sendo o “pai dos burros”!) que elas, além de exprimirem estados emocionais e auxiliarem a expressividade para o interlocutor, “dispensam estruturas linguísticas mais elaboradas”.

Arre, cheguei ao porto de destino!

Me descobri, ó céus!, uma interjeicionista de alta amperagem na interação com as postagens no Facebook e no Whatsapp. Quando preguiçosamente semeio emoticons, simpáticas faces/formas interjeicionais, e dou um piparote nas frases mais elaboradas. Raios! Substituo o verbal pelo visual, troco a frase pela exclamação, recuso a reflexão e assumo tão somente as “emoções que vivi”.

Ai, ai, ai! Começo a perder a argumentação para colocar em seu lugar a primeira impressão, os sentidos à frente do pensamento, a rapidez como descarte da interlocução, a pressa como desculpa para a desconsideração.

Caramba! Se a língua é parte de minha identidade, perco-me e perco-a. Embrutecida em sinais gráficos, robotizo-me.

Socorro! Ainda bem que, de vez em quando, obrigam-me a comprovar que não sou um robô! Talvez essas perspicazes e autoritárias plataformas digitais tenham pescado em minha atividade nas redes os peixes emocionais em cardumes cada vez mais numerosos.

Oxalá eu consiga recuperar um pouco daquela linguagem menos emotiva dos autores da minha infância!

Cáspite! Esse apego ao passado talvez seja apenas mais um sintoma da idade para além da faixa etária saudável. Alarme em alerta.

  • Autor: Acadêmica Marta Morais da Costa
  • Foto: cedida pela autora
  • Imagem: Absolutvision por Pixabay