Os curdos constituem um grupo étnico, que se considera nativo de uma região do Oriente Médio conhecida por Curdistão, situada em parte do Irã, Iraque, Síria e Turquia.

Não é povo árabe, mas de ascendência indo-europeia. Descendem dos medos da Pérsia antiga. Um povo de longa trajetória histórica, com língua e cultura próprias. Sua população é hoje estimada em 25 a 30 milhões de pessoas. Constitui a maior etnia sem pátria do mundo. É povo de fé muçulmana, de maioria sunita e minoria xiita.

Durante a primeira guerra mundial a Inglaterra contou com a colaboração dos curdos na campanha contra a Turquia Otomana.

Cessado o conflito, foi celebrado o Tratado de Sèvres (1920), entre os Aliados e o sultanato da Turquia, quando o Império Otomano se desmantelou e perdeu grande extensão do seu território no Oriente Médio e na Europa, ao mesmo tempo que reconhecia o Curdistão como território autônomo, situado a leste do Eufrates e a norte da fronteira da Turquia com a Síria e passível de independência.

O Tratado, porém, não ganhou validade diante da recusa da Turquia de subscrevê-lo.

Ocorre, que o Tratado reservara aos curdos região de importante posição estratégica, rica em poços de petróleo. Além disso, a ocasião coincidiu com a eclosão da revolução de Kemal Ataturk (dos jovens turcos), que  procurou modelar uma Turquia moderna.

Assim, contando ainda com os temores da influência de uma Rússia comunista vizinha, todas essas circunstâncias levaram à revisão do Tratado de Sèvres e à adoção do Tratado de Lausanne (1923), que, no particular, afastou definitivamente a promessa de criação de um estado para a nação curda.

Foi então que, a pretexto de dar destino ao povo curdo, o governo inglês, a Liga das Nações, a “Lazard Brothers”, a “Casa Rothschild” e o príncipe de Gales, mantiveram entendimento reservado com a “Paraná Plantation” e os governos do Brasil e do Paraná, no sentido de retirar os curdos do enclave do Iraque, onde eram mantidos sob proteção do exército inglês, e alocar cerca de 100.000 deles em terras do Norte do Paraná. O território paranaense ainda mantinha baixa concentração populacional, mas os empreendimentos que se realizavam para sua colonização ofereciam amplas possibilidades de ocupação e trabalho.

Embora, depois de 1890, o ingresso de africanos e asiáticos no país dependesse de autorização especial do Congresso Nacional, esse consentimento foi obtido com aval do governo paranaense e influência da própria Sociedade das Nações.

Para cumprir essa missão foi mandada uma comissão presidida pelo general inglês J. Gilbert Brown, comandante da forças inglesas no Iraque e integrada por J.J. Johnson, secretário do Escritório Internacional Nansen para Refugiados, e Charles Renard, conselheiro da Legação suíça.

Em seguida a comissão esteve no Norte do Paraná para constatar as condições locais de vida e salubridade da região, com vistas a garantir a fixação do contingente beduíno em nosso pais e favorecer seu processo de aculturamento. Foram adquiridos 14 mil alqueires de terras, próximos de Jatai (relativamente isolados), cercados de arame farpado, na altura de 2,50m de altura, onde os curdos poderiam viver e trabalhar livremente.

O plano de imigração foi tratado em sigilo, mas em dezembro de 1933 a notícia vazou no Congresso Nacional e na Assembleia Estadual, despertando forte resistência. A imprensa curitibana não poupou manifestações de protesto, estampando diariamente sua repulsa ao que chamava de invasão “assíria”.

O gentílico “assírio” vogou nas manchetes da Gazeta do Povo carregado de expressões chulas que iam de “escória humana”, “raça sem fogões e sem altares”, “ferozes montanheses asiáticos” a “tribo duvidosa” e “invasão sabuja”,  que iria provocar um “vexame racial” ou “entrechoque racial”, capaz de produzir um verdadeiro “quisto alienígena”, como tantos outros do país. O protesto também ocupou então os microfones da Rádio Clube. A PRB2 recentemente instalada  era a “coqueluche” da cidade e uma das primeiras estações de transmissões comercial do Brasil. A emissora cedeu seu espaço e os advogados instalaram o programa “A Voz do Paraná”, em que os curdos eram apresentados como sendo indesejáveis: uma “lixívia da sociedade”. As vozes, entre outras, eram do advogado Benjamin Lins, do promotor Laertes Munhoz, do professor Macedo Filho. Foram realizados comícios na Praça Osório, com a presença de grande número de povo. O Instituto dos Advogados se incorporou ao protesto, seguido do Instituo Histórico, o Círculo de Estudos Bandeirantes, o Feminino de Cultura, a Federação Operária do Paraná.

Some-se a isso tudo o quadro político vigente no país, em clima de elaborar a Constituição de 1934 e promover a eleição dos governos estaduais, em que o interventor Manoel Ribas era um dos postulantes.

Assim, diante de todo esse amplo cenário estadual de forte resistência social e mescla de preconceito, embora promovidas as primeiras tratativas de imigração, a direção da Companhia de Terras acabou por se convencer que a presença dos curdos nas suas terras iriam comprometer seu comércio imobiliário e afastar os compradores, diante dos fortes preconceitos revelados.

E tudo isso, enfim, levou à suspensão definitiva do projeto internacional da emigração dos curdos para o Paraná.

  • Autor: Acadêmico Rui Cavallin Pinto
  • Foto: Arquivo